Cuide Bem Do Seu Lixo.
Pessoal, o dialogo abaixo trata de um assunto muito delicado: segurança da informação.
Não basta ter uma excelente estrutura de proteção da informação eletrônica e meios de controle de acesso, se as informações impressas ficarem abandonadas sobre as mesas, se não existir um tratamento adequado do lixo (informação impressa descartada). O lixo pode arruinar as estratégias de mercado de uma empresa, se cair na mão dos concorrentes. Isso vale tb para o lixo de sua casa. Portanto, fique mais atento e não jogue no lixo aquilo que não quer que alguém descubra.
NARRADOR: Dois vizinhos encontram-se na área reservada ao depósito de lixo do edifício. Cada um com seu pacote. É a primeira vez que se falam.
HOMEM — Bom dia...
MULHER — Bom dia.
HOMEM — A senhora é do 610.
MULHER — E o senhor do 612.
HOMEM — É.
MULHER — Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...
HOMEM — Pois é...
MULHER — Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...
HOMEM — O meu quê?
MULHER — O seu lixo.
HOMEM — Ah...
MULHER — Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena...
HOMEM — Na verdade sou só eu.
MULHER — Mmmm. Notei também que o senhor usa muita comida em lata.
HOMEM — É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...
MULHER — Entendo.
HOMEM — A senhora também...
MULHER— Me chame de você.
HOMEM — Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo. Champignons, coisas assim...
MULHER — É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas como moro sozinha, às vezes sobra...
HOMEM — A senhora... Você não tem família?
MULHER — Tenho, mas não aqui.
HOMEM — No Espírito Santo.
MULHER — Como é que você sabe?
HOMEM — Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo.
MULHER — É. Mamãe escreve todas as semanas.
HOMEM — Ela é professora?
MULHER — Isso é incrível! Como foi que você adivinhou?
HOMEM — Pela letra no envelope. Achei que era letra de Professora.
MULHER — O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.
HOMEM — Pois é...
MULHER — No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.
HOMEM — É.
MULHER — Más notícias?
HOMEM — Meu pai. Morreu.
MULHER — Sinto muito.
HOMEM — Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos.
MULHER — Foi por isso que você recomeçou a fumar?
HOMEM — Como é que você sabe?
MULHER — De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo.
HOMEM — É verdade. Mas consegui parar outra vez.
MULHER — Eu, graças a Deus, nunca fumei.
HOMEM — Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...
MULHER — Tranqüilizantes. Foi uma fase. Já passou.
HOMEM — Você brigou com o namorado, certo?
MULHER — Isso você também descobriu no lixo?
HOMEM — Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel.
MULHER — E, chorei bastante. Mas já passou.
HOMEM — Mas hoje ainda tem uns lencinhos...
MULHER — É que eu estou com um pouco de coriza.
HOMEM — Ah.
MULHER — Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo.
HOMEM — É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.
MULHER — Namorada?
HOMEM — Não.
MULHER — Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.
HOMEM — Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.
MULHER — Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.
HOMEM — Você já está analisando o meu lixo!
MULHER — Não posso negar que o seu lixo me interessou.
HOMEM — Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia.
MULHER — Não! Você viu meus poemas?
HOMEM — Vi e gostei muito.
MULHER — Mas são muito ruins!
HOMEM — Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados.
MULHER — Se eu soubesse que você ia ler...
HOMEM — Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela?
MULHER — Acho que não. Lixo é domínio público.
HOMEM — Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?
MULHER — Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que...
HOMEM — Ontem, no seu lixo..
MULHER — O quê?
HOMEM — Me enganei, ou eram cascas de camarão?
MULHER — Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.
HOMEM — Eu adoro camarão.
MULHER — Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...
HOMEM — Jantar juntos?
MULHER — É.
HOMEM — Não quero dar trabalho.
MULHER — Trabalho nenhum.
HOMEM — Vai sujar a sua cozinha.
MULHER — Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.
HOMEM — No seu lixo ou no meu?
Autor: Luiz Fernando Veríssimo
Enviado por Guilhermina Mendes, ADM. Fazendária de Sete Lagoas. Graduando no curso de Gestão Pública.
1 Commentários:
Oi Nayane. Esse diálogo é muito bom. Abraços, Marcos
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